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Veja o vídeo e saiba como foi a primeira vitória de Niki Lauda na Fórmula Vee

Veja o vídeo e saiba como foi a primeira vitória de Niki Lauda na Fórmula Vee

Um dos maiores nomes do automobilismo, o piloto austríaco iniciou sua carreira na FVee,
onde correu duas temporadas e conquistou três vitórias (uma oficial).

Por Fernando Santos

 

É mais difícil vencer na Fórmula Vee do que na Fórmula 1? Para Niki Lauda, a resposta é sim. O piloto austríaco, tricampeão mundial de F1 e um dos maiores nomes da história do automobilismo, ganhou três vezes na FVee: apenas uma vez em prova válida por competições e duas delas em corridas extra-oficiais.

Somente há pouco tempo foi divulgado um vídeo com imagens raras desta primeira vitória de Lauda na Fórmula Vee. Foi numa prova em Sopron, na Hungria, em 1969. Este foi o auge de uma carreira com 21 provas e nenhum título na categoria. Mas que ficou marcada como mais um sinal da obstinação e vontade de se tornar um grande campeão, características que o seguiram por toda a vida.

Acesse o canal da Fórmula Vee Brasil no YouTube para assistir ao vídeo divulgado na Hungria em 2015:

https://www.youtube.com/watch?v=gX3ZSBHSuwc

E, a seguir, leia sobre a prova e a carreira de Lauda na categoria. Este vídeo foi postado pela primeira vez no canal do youtuber Jackson Retro.

 

Invasão austríaca na Hungria

A prova histórica da primeira vitória de Niki Lauda aconteceu na pista de rua na cidade de Sopron, na Hungria, que fica na fronteira com a Áustria e a 213 km da capital Budapeste. Foi no início do verão europeu, em 6 de junho de 1969, o que levou uma multidão ao autódromo montado em meio a um parque e avenidas com postes de iluminação na calçada (um perigo que viria a se confirmar).

Devido à sua localização, milhares de austríacos viajaram à pequena cidade húngara para acompanhar os pilotos da equipe Kaimann, a mais tradicional e que se tornou um ícone na Fórmula Vee. Niki Lauda não era o principal nome do time. O grande destaque era o também austríaco Erich Breinsberg, que havia vencido em Sopron no ano anterior.

 

Niki Lauda (#6) na histórica prova em Sopron, na Hungria, onde conquistou sua primeira vitória na Fórmula Vee, em 1969 (crédito: reprodução Facebook).

 

Lauda estava em sua primeira temporada completa na Fórmula Vee e, apesar de correr numa equipe de ponta, não era favorito para vencer na pista de 5.371 metros conhecida como Szabadsag, local hoje chamado de Lover Boulevard. Havia ainda pilotos alemães, da antiga Iugoslávia e apenas um húngaro, Ferenk Kiss, com o nome que lembra o maior esportista da história do país: o craque do futebol Ferenc Puskas.

 

Vitória por um fio de cabelo e acidentes

Cerca de 15 mil pessoas estavam nas calçadas para acompanhar a prova de 15 voltas, disputada sob uma temperatura elevada de 30 graus Celsius. Os dois pilotos da Kaimann saíram na frente e travaram uma árdua batalha pela liderança. Erich Breinsberg mostrou sua condição de favorito ao registrar a melhor volta, com o tempo de 2min08seg a uma velocidade média de 151 km/h.

Não só a briga entre os pilotos da Kaimann marcou a prova em Sopron. Vários acidentes foram registrados, até com gravidade. O primeiro foi justamente com o húngaro Ferenc Kiss. Ele saiu da pista e caiu numa vala. O carro pegou fogo. O competidor local conseguiu sair a tempo e teve apenas queimaduras e ferimentos leves.

Logo em seguida outros dois carros bateram, um piloto teve fratura na perna e outro ferimentos na cabeça. Houve pelo menos mais um acidente, como mostra o vídeo da prova, com um piloto que bateu de frente num poste. Ele ficou estirado no asfalto, onde foi atendido e levado em seguida por uma ambulância. O carro ficou quase totalmente destruído e as imagens mostram policiais tentando desobstruir a pista para a continuação da prova.

Em meio aos acidentes, os pilotos da Kaimann seguiram na disputa pela ponta. “Estavam se matando para saber quem venceria”, como foi descrito pelo portal húngaro www.kisalfold.hu. No final, Niki Lauda cruzou em primeiro “por um fio de cabelo”, com Breinsberg em segundo. Outro piloto austríaco, Fritz Bohler, com um Austro, foi o terceiro.

Nas imagens recém-reveladas, Niki Lauda aparece com o carro número 6 ao final da prova celebrando a sua primeira vitória na categoria com o dono e idealizador da equipe Kaimann, Kurt Bergmann, sentado na traseira do carro.

 

Das montanhas para a Finlândia

Niki Lauda teve uma carreira rápida e discreta na Fórmula Vee. Tudo começou em 1968, quando ele fez a sua primeira corrida de carros. A bordo de um Mini Cooper S, ele ficou em segundo lugar numa prova de subida de montanha, tradicional na Áustria. Logo em seguida, ele comprou um Porsche 911, o que só o ajudou a apertar ainda mais seu curto orçamento.

A falta do apoio mesmo de uma rica família, contrária a sua participação em corridas, reforçou o caminho para a Fórmula Vee, que surgia na Europa como a categoria de baixo custo e elevada competitividade.

O convite partiu de Kurt Bergmann, ex-piloto de kart e dono de uma concessionária Opel que criou a Kaimann em 1966. Ele havia sido um dos muitos convidados da Volkswagen, um ano antes, para conhecer os carros da FVee trazidos dos EUA, onde nasceu a categoria. A Kaimann logo se transformou numa das principais equipes da Europa.

Apesar de omissões em algumas de suas biografias, a primeira prova de Lauda aconteceu no desafio Áustria-Finlândia, realizado em 8 de setembro de 1968, no antigo circuito finlandês de Keimola, na cidade de Vantaa. A pista de 3,3 km foi desativada em 1978.

Lauda dirigiu cerca de 1.800 km de Viena até a Finlândia levando o seu Kaimann na carreta. Ao todo, cinco pilotos austríacos competiram. A equipe Kaimann ficou com os dois primeiros lugares, com vitória de Gunther Huber e o lendário Helmut Marko em segundo. O terceiro foi o também austríaco Lothar Shoerg, com um FVee da Austro, principal rival e que contava com apoio direto da VW alemã.

Niki Lauda terminou sua estreia na FVee em quarto lugar. Ele ficou à frente de um dos maiores nomes da categoria na Finlândia, Mikko Kozarowitsky. Durante muitos anos, este finlandês foi o maior rival de um dos grandes nomes do automobilismo mundial: Keke Rosberg, que colecionou diversos títulos na FVee e competiu na Super Vee também pela equipe Kaimann, antes de chegar à F1, onde foi campeão em 1982 pela Williams.

 

CLIQUE AQUI para conhecer a história de Keke Rosberg na FVee!

 

Coleção de vices e recorde em Nurburgring

A primeira temporada de Niki Lauda na FVee foi apenas uma adaptação ao carro, no final de 1968. Além da viagem à Finlândia, há registros de outras três provas disputadas: uma em Aspern, uma em Innsbruck e outra em Dopplerhutte, onde alcançou seu melhor resultado, o segundo lugar, que acabou sendo a sua posição mais frequente no pódio da categoria.

Somente em 1969 Niki Lauda disputou a temporada completa, que começou com um grande susto. Após a abertura em Hockenheim, na Alemanha, onde terminou em quarto lugar, Lauda sofreu um forte acidente, sem graves ferimentos, em Aspern, no circuito de Viena.

Lauda sempre foi conhecido por sua incrível disposição de melhorar sempre, o que também foi uma marca na FVee. Ele bateu uma marca histórica em Nurburgring, na Alemanha, ao se tornar o primeiro piloto a completar uma volta no extenso circuito de 22 km e 170 curvas em menos de 10 minutos. Ao final, chegou em segundo lugar.

Ao todo, Lauda disputou 21 provas entre o final da temporada de 1968 e a completa em 1969, sempre correndo pela Kaimann. Não conquistou nenhum título e terminou em terceiro no Campeonato Austríaco, vencido pelo principal nome da categoria na época, Erich Breinsberg. Lauda ainda conquistou mais duas vitórias em provas extra-oficiais: em Monza e em Munique, na sua despedida da categoria.

 

Niki Lauda (#19) no grid de largada da FVee, em 1969 (crédito: Kaimann Racing Team).
Na sequência, Niki Lauda nos boxes da FVee, em 1969 (crédito: Kaimann Racing Team).

 

A carreira discreta na FVee serviu para estimular ainda mais Niki Lauda em seu objetivo de triunfar no automobilismo, como registrou seu biógrafo, Herbert Volker. Segundo ele, Lauda era um piloto que começa a demonstrar talento, mas não entendia da parte técnica e mostrava uma certa incapacidade, natural para um garoto de 20 anos que só se preocupava em competir e economizar ao máximo. Tinha uma vida simples e totalmente dedicada ao automobilismo. Inclusive, ele costumava ser visto frequentemente com a mesma roupa.

Além disso, diz o biógrafo, a falta de melhores resultados na FVee mostrou a maior característica do piloto austríaco: sua obstinação pela vitória. Como ocorreu após o grave acidente que sofreu na F1, com queimaduras graves que ficaram marcadas pelo resto de sua vida. Mas que não o impediram de voltar a correr menos de dois meses depois. O acidente ocorreu em 1976, justamente em Nurburgring, onde ele havia estabelecido o recorde da Fórmula Vee sete anos antes.

Após deixar a Kaimann, Lauda usou a influência do nome da família para buscar novos patrocinadores e financiar seus próximos passos. Ele comprou um Porsche 908 e também correu com um famoso Opel do dono da Kaimann conhecido por “Viúva Negra”. Mas encontrou seu caminho na Fórmula 3. Ele acertou para competir pela McNamara Team, de Francis McNamara, um ex-soldado americano que havia competido de Fórmula Vee na Alemanha.

Da F3 em diante, Lauda fez história até conquistar três títulos na F1. Ele morreu em maio do ano passado, aos 70 anos, após complicações de saúde, principalmente nos pulmões, deteriorados em razão do terrível incêndio com a sua Ferrari.

 

Homenagem da FVee Brasil e de Wilson Fittipaldi

Logo após sua morte, Niki Lauda foi homenageado pela Fórmula Vee Brasil. Um carro foi construído e estilizado como na época em que ele competia pela Kaimann.

 

Carro estilizado pela Fórmula Vee Brasil em homenagem a Niki Lauda, em prova do Campeonato Paulista, em Interlagos, em 2019 (crédito: Claudio Larangeira).
No detalhe, o FVee de Niki Lauda (#18) em prova da FVee em 1969 (crédito: Volkswagen Motorsports).

 

Wilson Fittipaldi Júnior, um dos pioneiros da FVee no Brasil e atual consultor técnico e instrutor de jovens pilotos, lembrou assim do seu companheiro na F1:

Nunca vi um piloto reclamar dele. Sempre foi uma pessoa muita respeitosa, com uma capacidade técnica enorme para pilotar e acertar carros, e que dirigia com muita lealdade. Nunca corremos na mesma equipe, mas tínhamos uma boa amizade. Sempre que possível, na sexta-feira do fim de semana de provas, saíamos para jantar. Sua morte foi uma grande perda, ele sofreu demais após o acidente, inalou muita fumaça, o que afetou os seus pulmões. Mas ele teve uma história muito bonita e vitoriosa, dentro e fora das pistas. É assim que vamos lembrá-lo.

 

Curiosidades de um menino levado

Apesar de estar numa família rica, o que poderia ser um fator decisivo num esporte de alto custo, não foi fácil para Andreas Nikolaus Lauda chegar e fazer sucesso no automobilismo.

O pequeno Niki nasceu em Viena, em 1949, num berço de ouro da família que cresceu com a retomada industrial após a Segunda Guerra Mundial.

Seu pai gostaria que ele participasse de esportes da elite austríaca, como competições de hipismo. Mas foi o avô, Hans Lauda, quem o colocou pela primeira vez diante de um volante, para dirigir um Jaguar, entre os vários carros da coleção da família.

Niki Lauda não gostava de cavalos nem de estudar. Matava aulas com frequência e bombou duas vezes. Anos depois, confessou que falsificou o diploma de formatura no ensino médio para, enfim, ganhar o reconhecimento dos pais, e um beijo de sua mãe.

 

Literalmente voando de Fusca

Nos duros anos escolares, o pai de Lauda perdeu a paciência e colocou o filho num curso de mecânica de automóveis. Em seguida, Niki foi trabalhar numa oficina, onde mostrou que aquele não era seu lugar, mal sabia trocar o óleo. Na sua primeira tentativa, conseguiu destruir o motor de um Volvo!

Seu primeiro carro foi um Fusca conversível, com o qual ele demonstrava mais travessuras. Nas vias dentro da propriedade da família, ele construiu uma rampa. Queria saber quanto tempo um Fusca poderia ficar no ar. Segundo ele revelou em uma de suas biografias, o recorde foi de 22 metros e várias molas e amortecedores estourados.

Niki Lauda acabou influenciado a competir ao arrebentar um Mini Cooper S do pai de um amigo ao barbarizar pelas ruas de Viena às 4h da manhã. Para não dar vexame e ter que se explicar ao proprietário, ele usou uma de suas habilidades à época: a mentira. Pediu dinheiro emprestado à avó para comprar o que restou do carro, alegando que poderia ser preso.

Lauda então conheceu seu primeiro mentor no automobilismo: Fritz Baumgartner. Este sujeito era conhecido como “Mini-King” e um figurão das corridas. Com ele, Lauda deu aquele carro batido como parte de pagamento de um novo. Pediu ainda dinheiro aos pais, jurando que queria apenas aprender mais sobre mecânica e preparação de carros. No dia seguinte, em maio de 1968, começou a correr. E ao final do ano já estava na Fórmula Vee.

 

Escola de campeões

Ao todo, a equipe austríaca Kaimann revelou oito pilotos para a Fórmula 1, que conquistaram quatro títulos: três com Niki Lauda e um com Keke Rosberg. Os outros pilotos da equipe que chegaram à F1 foram Helmut Marko, Helmuth Koinigg, Dieter Quester, Harald Ertl, Jochen Mass e Jo Gartner.

 

Niki Lauda no carro da equipe Copersucar-Fittipaldi em 1977, antes do GP de Zandvoort, na Holanda (crédito: Reprodução Sprint/1977).
Na sequência, foto de reencontro histórico dos 50 anos da equipe Kaimann, em 2016:
a partir da esquerda, Eric Breinsberg, Niki Lauda, Helmut Marko e Kurt Bergmann (crédito: Kaimann Racing Team).

 

Lauda entrou na Kaimann no lugar de Helmut Marko, que passou a correr na F3 até chegar à F1. Marko ainda venceu as 24 horas de Le Mans, em 1971, e anos mais tarde se tornou um dos principais responsáveis pelo sucesso da equipe Red Bull e pela revelação do tetracampeão mundial Sebastian Vettel.

 

 

 


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